10 de janeiro de 2011

EDITORIAL VIII

O PROJETO ARENA – DOIS ANOS DEPOIS

SEGUNDA PARTE – OUTROS ASPECTOS ALÉM

DA QUESTÃO TERRENO

A revelação do que se ajustou em dezembro de 2008

O Negócio Arena, em linhas gerais, deveria, tal como o designado no Edital de convocação do Conselho Deliberativo, datado de 08/12/2008. Ser regulado por três instrumentos contratuais, cujos títulos foram ali assim designados:

a) Instrumento de contrato atípico para a aquisição de imóveis, assunção de obrigação de construção e outras avenças, tendo como partes firmatárias Grêmio FPA e Construtora OAS Ltda.;

b) Instrumento particular de promessa de compra e venda e promessa de cessão de direitos com condições precedentes, tendo como partes designadas Grêmio FPA, Proprietária S/A, e como Intervenientes Anuentes designadas, Construtora OAS Ltda. e Superficiária S/A.

c) Escritura pública de constituição de direito real de superfície e outras avenças, tendo como partes designadas, Proprietária S/A e Superficiária S/A e, como Interveniente Anuente designado Grêmio FPA.

Examinados o negócio e as minutas de tais contratos por diversas comissões especiais do Conselho Deliberativo ( mais ou menos setenta pessoas de um universo de 314) foram por elas acolhidos como perfeitamente aceitáveis pelo Grêmio, seguindo-se recomendação de aprovação pelo plenário.

Em regime de urgência urgentíssima, o CD aprovou na noite de 16/12/2008 o negócio Arena e as minutas dos 3 contratos que o configurariam, ficando alguns pontos delas apenas contingenciados ao atendimento, pelos membros gestores da negociação, de poucas recomendações e ressalvas levantadas pelo plenário e comissões na reunião. Tudo isso a efetivar-se até a ocasião das assinaturas, determinada realizarem-se impreterivelmente nos três dias subseqüentes.

Destarte, todos os conselheiros presentes à reunião de 16/12/2008, dali saíram absolutamente convencidos de que nos aludidos dias imediatos deveriam ser impostergavelmente assinados os três instrumentos contratuais. Tudo em razão da urgência emprestada a tal celebração, assentada no anunciado vencimento dos prazos relativos à designação das cidades sede da Copa de 2014 (15/01/2009), combinado com o período recessivo de negócios relativo às festas de fim-de-ano e férias, fator dispersivo de atenções.

Aparentemente, tais fatos ocorreram: a 19/12/2008 em cerimônia amplamente coberta pela imprensa e com a presença de inúmeras autoridades federais, estaduais e municipais foram firmados documentos

pelas partes, por suposto dotados de todos os conteúdos supra mencionados.

Estes, todavia, quedaram-se por um vasto período de tempo completamente oclusos à vista de quem quer que fosse. Foram subtraídos ao conhecimento geral–conselheiros, associados, público e imprensa - exceto aos formuladores e agenciadores diretos do negócio do Grêmio e da OAS.

O público em geral só veio a conhecer o negócio e o que tinha sido firmado pelo Grêmio, quase um ano depois, nas vésperas do Natal seguinte, o de 2009, quando o ex-presidente Hélio Dourado, em função exclusiva de seu prestígio pessoal de ex-presidente, obteve vias dos instrumentos junto à direção do clube, passando então a divulgar os conteúdos.

E o que se observou então ?

1) Dos três contratos previstos apenas um fora assinado – o atípico - deixando de sê-lo os dois outros, o de promessa de venda e cessão do Estádio Olímpico pelo Grêmio à empresa Proprietária S/A. e o de constituição de direito de superfície, a ser firmado entre essa última e a empresa Superficiária S/A.

2) Isso ocorreu porque duas das três principais partes legitimadas desses 3 contratos previstos ( as empresas Proprietária S/A. e Superficiária S/A., ambas, no Projeto, participantes como subsidiárias da Construtora OAS Ltda.) inexistiam juridicamente na data da assinatura ( 19/12/2008), algo que passou em branco nas informações prestadas ao CD e, também por causa disso, restou no desconhecimento geral dos interessados (público).

3) Como inexistiam, não poderiam firmar qualquer ajuste, visto que nosso ordenamento civil não admite nem reconhece o alcance e o exercício de direitos, bem como a assunção de obrigações por parte de pessoas jurídicas nascituras. De modo que nenhuma dessas duas empresas, na ocasião, vinculou-se ao Grêmio, nada este devendo-lhes e por elas nada sendo devido ao clube em função do estabelecido nessas três avenças.

4) O único ajuste firmado, o chamado “contrato atípico”, foi pactuado somente entre o Grêmio e a empresa Construtora OAS LTDA. a qual, na realidade, não integra o plano principal do Projeto Arena, senão que através de suas duas subsidiárias mencionadas. De fato, em tal negócio, ela não adquire o terreno de Humaitá, não institui sobre ele direito de superfície, não recebe esse direito, não transfere tal imóvel e direitos ao Grêmio FPA, não recebe deste o Estádio e a área do Olímpico, não administra o Estádio Arena e etc., e, por via de conseqüência, não contrai ou investe-se perante o clube de quaisquer obrigações ou direitos pertinentes, tanto ao negócio empresarial quanto ao jurídico, objetos do projeto trazido à consideração, apreciação e aprovação de seu CD.

5) Não há , pois, no Projeto Arena, vínculos diretos entre a dita controladora e o Grêmio, salvo a promessa de assunção de solidariedade posterior às obrigações de suas subsidiárias e um que outro compromisso, essencialmente a cumprir-se no porvir, versando sobre gerenciamento de controles acionários das controladas e outorga de preferências nesse campo.

6) Como se vê, também, no contexto do “contrato atípico”, o nele convencionado aponta para o desenvolvimento do Projeto Arena em etapas, a partir da ocorrência e implementação de condições específicas estipuladas ali, algumas comutativas e outras aleatórias, todas tendentes ao alcance da necessária efetivação do lá pactuado, via os dois contratos até hoje ainda não firmados pelo Grêmio FPA e pelas empresas Proprietária S/A e Superficiária S/A. Assim:

6.1) A obtenção, do Poder Público, de índices construtivos excepcionais para as áreas do terreno de Humaitá e do Bairro Medianeira (Olímpico), bem como instrumentos legais tendentes à liberação dos ônus de inalienabilidade e impenhorabilidade que recaiam, há décadas, sobre o primeiro;

6.2) A obtenção, do Poder Público, da transferência do encargo donativo que recaia sobre o terreno de Humaitá para outro imóvel, liberando este último para a negociação aquisitiva.

6.3) A constituição das empresas Proprietária S/A e Superficiária S/A. (registro na JC) pela Construtora OAS Ltda. até a data de 19/02/2009.

6.4) Assunção formal, pelas duas empresas citadas, depois de constituídas e dentro do mesmo prazo, de todos os direitos e obrigações a si atribuíveis, capitulados no “contrato atípico”.

6.5) A aquisição do terreno de Humaitá destinado ao estádio ARENA pela empresa Proprietária S/A;

6.6) O desmembramento do terreno global de Humaitá em duas partes, uma destinada ao estádio ARENA e outra à exploração imobiliária, aqui exclusivamente pela parceira OAS, futuramente.

6.7) A constituição, concomitante ou imediata, do direito de superfície, pela empresa Proprietária S/A. em favor da empresa Superficiária S/A. da parcela do aludido terreno destinada ao Estádio Arena;

6.8) A obtenção, pela empresa Superficiária S/A. e até a data limite de 05/03/2010, pena de resolução dos ajustes, de financiamento bancário destinado à construção , em três anos, do Estádio Arena, no montante de R $ 140.000.000,00 e a aplicação, na obra, pela dita empresa, de capital próprio, num montante de R $ 170.000.000,00.

6.9) A entrega do Estádio Arena , pronto, ao Grêmio, inteiramente livre de quaisquer ônus, ao final desse prazo, contra o recebimento da propriedade do Estádio Olímpico

7) A liberação do terreno de Humaitá para comercialização, todavia, não estava cingida apenas a essa transferência de encargo e gravames, senão que também a uma série de incumbências e eventos a serem cumpridos previamente à transação, pela atual proprietária, Federação dos Círculos Operários do Rio Grande do Sul, todos relativos à existência, no local, de colégios e outras instalações de cunho social e serviços, públicos e privados.

8) Assim, impunha-se, de plano, a remoção do local, pelos interessados, da escola de segundo grau, Colégio Santo Inácio, embora a mudança restasse sem anotação quanto a localização substituta, prazos e especificações construtivas, quer na lei, quer no “contrato atípico”

9) De outra parte, ficava obrigada a entregar ao Estado do RGS um prédio escolar em terreno futuramente indicado por esse, com idênticas dimensões do prédio atual da Escola Estadual Oswaldo Vergara, de primeiro grau (lá situada), a demolir-se.

10) Igualmente, a entregar 8 salas de aula e demais dependências em substituição aos dois prédios de madeira a serem demolidos, existentes junto ao Colégio Estadual Carlos Fagundes de Mello, situado na zona, Bairro Humaitá.( Rua Irmã Maria José Trevisan)

11) Também ficava circunscrita a realizar a ampliação de duas salas de aula no atual prédio da Escola Estadual Danilo Antonio Zaffari, localizada à Rua Marcos Kruchin, s/n, no Bairro Navegantes, nesta Capital todos no Município de Porto Alegre.

12) Por sobre tudo isso, ainda, alcançar a ordem de remoção, com tomada de posse, do CTG Vaqueanos da Tradição, da Escola de Escoteiros, de um Posto da Brigada Militar e de 3 bares e restaurantes.

13) Assim, para que o terreno de Humaitá, pertinente ao estádio ARENA, fosse, livre e desembaraçado de ônus, gravames e/ou encargos donativos, transferido pela Federação dos Círculos Operários do RGS para a empresa Proprietária S/A., subsidiária da Construtora OAS Ltda,, nos moldes do Projeto Arena, fazia-se necessário, além do desmembramento retro mencionado e da constituição regular dessa adquirente na Junta Comercial, o atendimento a todas essas determinações legais e providências possessivas.

À luz do estabelecido no “contrato atípico”, caberia à subsidiária da Construtora OAS Ltda., denominada provisoriamente Proprietária S/A. , ao adquirir a totalidade do terreno de Humaitá, segmentá-lo em seguida nas duas partes mencionadas, promovendo os registros pertinentes no CRI competente, assim obtendo matrícula própria para a área do estádio.

No entanto, dada a falta de constituição da referida empresa Proprietária S/A(até hoje e por razões que não se conhece), decidiram os gestores do negócio, pelo Grêmio, e os provisórios, pela Construtora OAS Ltda., alterarem as condições do Projeto, na parte referente ao patrocínio do pedido de desmembramento: atribuiu-se à própria Federação dos Círculos Operários do RGS, a proprietária do terreno, a incumbência de efetuar tais pleitos junto ao CRI, algo que, por meia dúzia de vezes tentou, sem êxito, nestes dois anos.

Por decorrência, a propriedade do terreno onde assentará a construção do Estádio Arena, além de não individuada (com vida independente) não foi transmitida, até hoje para qualquer das partes integrantes e legitimadas do Projeto Arena. A construção que ora se realiza ali corre por conta de terceiros estranhos e da própria proprietária de sempre do terreno, a Federação dos Círculos Operários do RGS.Fato totalmente alheio ao negócio aprovado pelo CD do Grêmio, em dezembro de 2008.

O cenário e o ambiente pós assinaturas – A aprovação do Projeto e o licenciamento da construção

Durante todo esse vasto intervalo de tempo ocorrido desde a data do ajuste até os dias de hoje, a parceira Construtora OAS Ltda., além de omitir-se na prática e cumprimento de uma série de obrigações e prazos contratuais (constituição das empresas subsidiárias e sua capitalização) conforme adiante se explanará, promoveu, com a colaboração prestimosa do clube, uma série de ações de caráter meramente diversionista (propaganda) relativas ao empreendimento no local da obra.

Nessa linha, efetuou-se, ainda em 2009, a colocação de tapumes, empreitada a que eufemisticamente se chamou de “tapumização” (!) , em toda a periferia do terreno de Humaitá, com anúncios externos de breves obras e ilustrações da marca (logotipo) da empresa OAS, tudo visível e dirigido principalmente ao conhecimento dos incontáveis trafegantes da Free Way.

Depois, com a colaboração do Grêmio e já no presente ano de 2010, fez-se erguer no terreno um grande mastro, sobre plataforma de concreto, ostentando uma enorme bandeira do clube, visível a quilômetros, como se isso, simbolicamente, representasse uma conquista de posse definitiva e legítima do terreno pela entidade e uma indubitável irreversibilidade da construção e do negócio , tudo digno de anúncio aos quatro ventos.

Final e recentemente, patrocinaram , parceira e Grêmio, nessa linha, também um evento inusitado e exótico.

Com efeito, mediante significativa participação de massa de torcedores e do público em geral, numa formidável encenação cinematográfica, milhares de pessoas fizeram, na cidade, uma travessia do caminho entre o Olímpico e o terreno de Humaitá, tal como se fora um moderno Exodus, a bíblica migração do povo de Deus do Egito para a Terra Prometida, via Mar Vermelho, tudo para anunciar-se conjunta e festivamente, os eventos de lançamento da pedra fundamental do estádio ARENA e da recepção do chamado licenciamento de construção da obra, expedido pela Prefeitura sabe-se lá em nome de quem.

Pronunciamentos ocorreram e se fizeram candentes, inclusive de altos dirigentes do clube, os quais, inclusive, num eufórico, atropelado e deselegante linguajar de feira-livre, chamaram os constrnagidos e estigmatizados censores ou críticos do negócio ARENA, de “secadores”, como se gremistas não fossem e, sim, Calabares enrustidos.

Dito licenciamento também está envolvido em brumas, posto que o projeto arquitetônico, segundo consta, foi aprovado sem que constasse das plantas respectivas, nem o nome do dono da obra e nem o do proprietário do terreno. Restou, parece, no de um engenheiro ou arquiteto até aqui estranho ao modelo jurídico pactuado. Sabendo-se que o imóvel ainda se queda sob domínio da Federação, onerado com os supra mencionados gravames e encargo donativo, bem como anotado também, que das referidas plantas constam emblemas da Construtora OAS Ltda., do Grêmio e de uma terceira entidade inidentificada (só isso, não há carimbos ou assinaturas), incumbiria questionar-se de quem se trata esse isolado responsável inventado e sua participação efetiva no Projeto Arena, bem como a regularidade jurídico-administrativa da emissão desse licenciamento nessas condições, ausentes que estão do processo administrativo respectivo os efetivos participantes do empreendimento, reconhecidos e autorizados pelo CD do Grêmio em caráter exclusivo.

Enfim, tendo em conta que, por decorrência disso, a obra já iniciou ,impunha-se saber, afinal, quem está promovendo a construção, com quais recursos e de onde provém, vez que a empresa Proprietária S/A, , aquela, no contexto do negócio global, que deveria adquirir o terreno da Federação, como subsidiária da Construtora OAS Ltda., sequer existe. Por sua vez a outra, originalmente denominada Superficiária S/A e constituída com o nome de Arena Porto Alegrense S/A., a efetiva dona e responsável pela obra conforme os termos do Projeto Arena (futura titular do direito de superfície), possui capital ínfimo de R $ 1.000,00, absolutamente insuficiente ao atendimento dos suportes de uma obra de custo superior a R $ 300.000.000,00.

Recursos de tal forma ínfimos a ponto de se tornarem incapazes de sustentar sequer o custo dos foguetes da festa de lançamento da pedra fundamental e da substituição da bandeira ( foi, dia desses, roubada).

Tudo leva à conclusão de que se estão queimando etapas de forma improvisada, contando-se, além da alienação ou inconsciência do CD e dos associados, com a tolerância e complacência do Poder Público – tão cioso quanto às exigibilidades administrativas relativas a outras obras, as comuns, dos empresários caboclos - enquanto atropeladamente se providenciam condições de regularização do empreendimento, em todos os seus aspectos ( inclusive, remanejamento de escolas , ainda assentadas no local ao fim deste ano letivo, bem como transferência de gravames, com o encargo donativo para o terreno da Restinga).

Tudo isso, quase dois anos depois da aprovação (19/12/2008), pelo CD do Grêmio, do indigitado Projeto Arena, que deveria ter sido ajustado completamente três dias depois

O papel da imprensa, a comunicação social e o convencimento geral

Toda essa sucessão de acontecimentos, supérfluos ou não, foram devidamente acompanhados do tambor da mídia e seus altissonantes ecos induziram a sociedade em geral à admissão da irretratabilidade e irreversibilidade do negócio. A sua vez, os gremistas em particular, diante de tantas encenações, imergiram num estado de encanto hipnótico na suposição de que o Projeto Arena, finalmente viera para redenção do clube de suas mazelas permanentes, apresentando-se como certos os seus espetaculares resultados anunciados. E o estádio ARENA em Humaitá passou a representar um novo Xangri-lá, onde todos os conhecidos e históricos problemas de sobrevivência do clube estariam resolvidos.

Tudo sob uma atmosfera de comodidade, segurança, modernidade e sofisticação. Tudo formidável. Bem aventurança, enfim.

A isso se agregou, em todo esse tempo, uma permanente presença nos veículos de comunicação social, bem como em encontros periódicos dos setores corporativos do clube ( grupos políticos , comissões do Conselho e etc.), de arauto especial, designado pela direção do Grêmio, voltado exclusivamente à incumbência ou tarefa ou ofício de ir traduzindo quase semanalmente para os incautos, neófitos e embasbacados leitores/assistentes dessas publicações e tertúlias, as maravilhas do empreendimento, tendo por evangelho estudos efetuados pela FGV na véspera de toda essa história, comprovando a excelência do negócio e suas inquestionáveis solidez e rentabilidade.

Evidentemente róseo o desenho passado.

Sem prejuízo de se conhecer o final sempre feliz ou as conclusões inevitavelmente satisfatórias desses estudos de viabilidade econômico-financeira, de todos os naipes, encomendados à dita Fundação por entidades públicas ou privadas do país interessadas na otimização desses resultados (transformam nabos em ambrosia), incumbe registrar que o Parecer respectivo passou, a partir de sua recepção e divulgação, a constituir-se um novo Talmud no mundo tricolor, dadas suas conclusões indiscutíveis, invulneráveis a quaisquer críticas, ou seja, empreendimento fadado a um inevitável sucesso. Todas as verdades nele embutidas seriam insusceptíveis de dúvidas ou tergiversações.

E o arauto, um novo e redivivo Beato Salu.

Isso, permanentemente afirmado, passou a inibir quaisquer manifestações de dúvida ou censura à grande parte dos interessados, a ponto de retirar aos eventuais analistas mais cuidadosos, ainda que respeitáveis personalidades ou notórios agentes técnicos de nosso meio, qualquer credibilidade, se contrários, aqui e ali, a algum ponto, mesmo isolado, do Projeto Arena. Daí que resultou dessa situação um aparente desinteresse em abordá-lo, tornando o empreendimento um fato consumado, algo em torno do acabado e induvidoso. Criou-se, por isso, nos raros renitentes e incrédulos, mais do que uma anemia crítica, a insegurança de suas convicções e o medo do ridículo das próprias contestações.

Além do mais, uma verdadeira tropa de choque formou-se ao redor do aludido porta voz, um verdadeiro Papa da Renascença, na defesa do empreendimento, formada e liderada por dirigentes de largo conhecimento público, bem com o trânsito livre e penetração nos veículos de comunicação, assistidos por uma imprensa ao mesmo tempo comprometida e omissa, seja para emprestar um caráter de absoluta consistência a toda e qualquer providência ou movimento efetuado pelos operadores do negócio, seja para anunciar a sua perfeita adequação ao avençado originalmente entre partes, seja para obstruir o livre trânsito de notícias desconfortáveis, via o manejo do silêncio sobre o que não interessa ou convém divulgar-se.

Tal situação se deu em grande parte devido (a) ao magnetismo que as coisas novas em geral exercem sobre a imaginação dos jovens, a grande massa ativa dos aficcionados do clube e o fervor quase mítico que, pela paixão, dedicam à entidade, acreditando a verdade situada nos exatos limites da vontade e da opinião de seus dirigentes, principalmente os mais evidenciados e notórios; (b) essa sacralização do clube tende despir os fatos de seus componentes científicos e concretos e , por conseqüência, tornarem-nos permeáveis a meras valorações opinativas, de pronta e incondicional credulidade; (c) uma complacência e leniência - quase cumplicidade - do Poder Público no gerenciamento das providências burocráticas necessárias à colimação do Projeto, asfaltando, atalhando e abreviando os trâmites burocráticos pertinentes, tudo com escopo da angariação de verbas públicas federais para obras circunstantes às do Projeto, um poderoso chamariz em razão de seu robusto agente, um clube centenário num país quinhentista, dotado de apelos massivos a um mercado quase universal; (d) uma imprensa totalmente destituida de jornalismo (espírito) investigativo, posto que exclusivamente voltada à esfera das superficialidades e efemeridades dos assuntos desportivos, orientação esta há muito consagrada em nossa terra pelas editorias respectivas, dada a significativa quantidade de recursos captados tradicionalmente na publicidade da atividade, tal como assim simploriamente tratada.

De modo que, nessa atmosfera, ingrata a esgrima de fatos e argumentos capazes de levantar dúvidas ou suspeitas acerca seja da viabilidade do negócio, seja sobre sua higidez jurídica, seja sobre suas efetivas perspectivas econômico-financeiras. Há muito, os raros interessados no rescaldo disso tudo aí, ingressaram num estado de laissez faire , restando a entidade, mais do que fragilizada, à deriva e sucumbente diante dessa avalanche de acontecimentos, inusitados para seu destino de mera associação desportiva, com seu patrimônio, erguido por tantas gerações , submisso repentinamente a um negócio de risco avantajado sem que se possa discernir nem porquê e nem para quê exatamente.

Uma síntese da situação atual

Decorridos vinte e quatro meses da aprovação, pelo CD, do “Negócio Arena”, bem como da assinatura do “contrato atípico”,verifica-se, relativamente ao supra narrado:

a) As empresas Proprietária S/A e Superficiária S/A. não foram constituídas dentro do prazo contratual estipulado de 60 dias, contados da assinatura, isto é, até a data de 19/02/2009, sendo que a primeira, até hoje, não teve seus atos inaugurais registrados na Junta Comercial do RGS.

b) Como não foram constituídas até esse dia, tampouco firmaram ou ratificaram , dentro desse prazo, os direitos e obrigações descritos no “contrato atípico”, firmado em 19/12/2008 como a si atribuíveis

futuramente no Projeto ARENA.

c) A empresa Superficiária S/A. foi registrada na JUCERGS em data de 07 de maio de 2009, com o nome de ARENA PORTO ALEGRENSE S/A. tendo um capital, no entanto, de apenas R $ 1.000,00. Dito capital é absolutamente incompatível com os ônus atribuidos às suas principais funções no Projeto ARENA, que é de aportar, para a obra do estádio, recursos próprios, na ordem de R $ 170.000.000,00, tomando outros R $ 140.000.000,00 no mercado financeiro bancário e fornecendo garantias próprias na ordem de valores do respectivo saldo devedor.

d) Permanece o terreno global de Humaitá sem desmembramento, o qual foi tentado inutilmente , pela Federação, nestes quase dois anos, por várias vezes seguidas junto ao CRI da 4ª Zona desta Capital, sendo os pleitos e documentos devidamente impugnados por aquele Ofício.

.

e) Nessas condições, inocorreu a transferência da propriedade para a empresa Proprietária S/A., seja da área global, seja da área desmembrada, permanecendo, até hoje, em nome da Federação.

f) Por isso, remanesceriam incidentes sobre esse terreno global os gravames de inalienabilidade e impenhorabilidade, bem como o encargo donativo, consistente na construção da Universidade do Trabalho.

g) Dada a circunstância de que a inadimplência no cumprimento desse encargo implica, pelos termos da escritura primitiva de doação (1965), em reversão do imóvel ao patrimônio do Estado, impõe-se a solução da subrogação desse encargo para outro terreno – certamente o da Restinga – pena de impossibilitar-se a transferência da(s) propriedade(s) para a empresa Proprietária S/A.

h) Nessa linha, há uma impropriedade na lei que autorizou a transferência, dando a entender poder ser ela automática, com isso omitindo esse veículo legal, o da subrogação, para a consecução da operação.

i) Persistem, até hoje as partes vinculadas apenas aos termos do contrato atípico, ou seja, a um acordo provisório e preparatório, também inteiramente sujeito a condições suspensivas, tudo no aguardo de suas implementações, sem prazo previsto.

j) Das ditas partes, uma, a Construtora OAS Ltda. não se constitui legitimada efetiva aos direitos e obrigações do negócio ARENA, na fase em que se encontra, posto que só participará daquele quando, efetivamente, suas subsidiárias firmarem os instrumentos re-ratificativos do aludido ajuste precário, ou via os contratos de promessa de venda e cessão (permuta) e de constituição de direito de superfície.

k) Não tendo havido a apropriação do imóvel de Humaitá, lógico se apresenta que também o financiamento da construção não foi obtido, tendo ocorrido o vencimento do prazo em 05 de março do corrente ano, sem que o clube tivesse tomado qualquer medida para denunciar o ajuste de 19/12/2008, ou, mesmo, como consta hipótese no contrato atípico, exigir uma repactuação do negócio global com a necessária nova outorga do Conselho Deliberativo.

l) Nenhum passo foi dado no sentido de obviar concretamente a situação dos associados do clube no novo estádio, salvo promessas vagas e repetitivas de que seus direitos serão preservados. O problema associativo não se resume, todavia, a esse impasse irresolvido, mas passa necessária e antecipadamente pela alteração das inconstitucionais disposições estatutárias que atribuem ao clube, de forma atrabiliária e prepotente, tirânica mesmo, poderes de cancelar títulos de propriedade a seu bel prazer.

Enfim, poder-se-ia aditar , neste ponto, mais algumas situações decorrentes desse estado de coisas, o que estenderia este trabalho a níveis exaustivos.

Importa, isto sim, é deixar anotados esses acontecimentos pertinentes ao Projeto Arena, nesses dois anos de sua efetiva existência para que, todos os gremistas , juntos, possam refletir sobre o muito que ainda existe por fazer, na direção do sucesso do empreendimento, corrigindo trajetórias e evitando os desvios até aqui observados.

Principalmente, tornar efetivamente transparentes as notícias sobre ele, o que, como viu-se retro, inocorreu.

Grato.

Porto Alegre, 19 de dezembro de 2010

ASSOCIAÇÃO DOS GREMISTAS PATRIMONIAIS


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